• Cachaça San Valle - Topo - Nilton Baresi
domingo - 07/05/2017 - 09:42h

A mentira-mor

Por François Silvestre

Reformar, no Brasil, não é apenas uma mentira. É a mãe das mentiras. A mentira-mor da nossa farsa. Agrária, tributária, política, previdenciária, tudo embuste. Meia-sola institucional.

Papai Noel de ilusão, defronte da garotada, que animada pela festa prefere fazer de conta ser de fato o velhinho com um saco cheio de presentes saídos da imaginação, e não do bolso dos parentes. Nas “reformas”, do bolso do contribuinte.

Os enganadores precisam da fé dos enganados. E fazem desse mercado de trocas uma acomodação de interesses.

Sobre as reformas de faz de conta há uma lição literária que resume como arquétipo as outras imitações. “Il Gattopardo” de Giuseppe Tomasi de Lampedusa.

O autor trata da decadência da aristocracia siciliana, durante o Risorgimento italiano, quando as lutas de unificação sinalizavam para uma nova ordem política, social e econômica.

O resumo da obra se dá no diálogo entre os personagens Don Fabrizio, príncipe decadente de Salina, com o sobrinho Tancredi, picareta príncipe de Falconeri. “É preciso que tudo mude, para que fique tudo do mesmo jeito”. Visconti adaptou a obra para o cinema, com Burt Lancaster, Alain Delon e Cláudia Cardinale.

O Brasil conseguiu superar a lição de Lampedusa. Aqui nem se muda nada para que tudo continue como sempre foi. E não raramente para pior do que era.

O golpe republicano apenas transformou a aristocracia monárquica em aristocracia republicana. Não foram os republicanos históricos que assumiram o poder. Quem tomou conta das decisões foram os próceres da Monarquia, agora republicanos.

O movimento de 1930 derrubou a República Velha sob o comando de um ex-ministro do governo decaído. E os antigos aliados do regime velho viraram sustentadores do regime novo.

A redemocratização de 1945 foi sustentada pelos mesmos sustentadores da ditadura Vargas. E o primeiro Presidente da nova ordem fora o avalista militar da ordem antiga.

O golpe de 1964 foi endossado pelos mesmos que se serviam do governo deposto. Partidos e imprensa. Os partidos foram extintos e a imprensa levou pé na bunda.

Ao cair a Ditadura, não foram os seus inimigos que assumiram o poder. Foram os seus aliados. Tancredo Neves negociou com militares e políticos que sustentavam o regime de violência. Quem assumiu o poder foi José Sarney, acólito político da Ditadura.

Lula representava o antimalufismo. Onde estão? Do mesmo lado, em todos os sentidos.

Collor foi a encarnação do antilulismo, o instrumento que evitou naquele momento a vitória do barbudo que assustava empreiteiros e classe média alta. Onde estão? Do mesmo lado, em todos os sentidos. Os empreiteiros, antes assustados, aliaram-se a Lula e ficaram íntimos. Papão e papados foram papar juntos.

No Brasil, a geografia fotografa Deus e a pátria revela Macunaíma.

Té mais.

François Silvestre é escritor

* Texto originalmente publicado no Novo Jornal.

Compartilhe:
Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. Vicente diz:

    As reformas são apenas mais uma oportunidade de os poderosos do momento imporem sua vontade de forma mais ampla.

Faça um Comentário

*


Current day month ye@r *

Home | Quem Somos | Regras | Opinião | Especial | Favoritos | Histórico | Fale Conosco
© Copyright 2011 - 2024. Todos os Direitos Reservados.