• Cachaça San Valle - Topo - Nilton Baresi
domingo - 06/03/2011 - 16:38h

A pedrinha jogada no oceano


Duas situações que testemunhei em quase 30 anos de profissão, como repórter, fizeram-me despertar cedo para o nível de importância que temos como comunicadores sociais. No âmbito da “engrenagem”, não somos quase nada. Ou em muitas situações, nada mesmo. 

Pura balela essa aura de “Quarto Poder” que é atribuída à imprensa, num país em que a quase totalidade dos meios de comunicação, convencionais, está nas mãos de políticos e plutocratas.

Quem tem algum poder é a empresa de comunicação e assim mesmo se conseguir transformar sua marca, numa instituição, o que raramente ocorre.

Muitos de nós pensamos que essa suposta força é transferida ou tem capilaridade, alcançando os componentes dessa organização, do editor a um repórter. Outra balela.

A própria informação deixou de ser monopólio do jornalista. A multiplicidade de meios de comunicação – jornalísticos ou não – e a pulverização de canais de interação na Internet, formam outro cenário de predomínio.

É a supremacia do instantâneo sobre o conteúdo, que esvazia mais ainda a força das corporações midiáticas. Põe em xeque teses e regras que vigoraram durante décadas e séculos, como a importância de um "furo" jornalístico.

Poucos profissionais conseguem chegar a ser uma marca própria. E isso leva tempo, numa trajetória sujeita a trovoadas, inúmeras provações e exigências. Feita de muitas renúncias.

Sim, mas vamos às histórias a que me referi, um pouco acima.

A primeira: O todo-poderoso diretor-geral do Diário de Natal, nos anos 80, Luiz Maria Alves, perdeu um filho muito jovem, em acidente de carro. Durante semanas, a solidariedade partiu de todos os cantos do estado e país, inundando as páginas do periódico de mensagens.

Brigado com o condomínio que controlava o grupo Diário Associados, Luiz Maria Alves sai para empreitada em faixa própria. Funda um jornal – "Diário do Estado" – que teve vida efêmera. Em um de seus últimos aniversários, em torno de um bolinho mixuruca, apareceram apenas uns poucos ex-colaboradores para os parabéns.

Morreu praticamente no anonimato, após décadas de poderio.

A segunda: Poucos anos antes, eu era o segundo homem na hierarquia jornalística da Gazeta do Oeste. Até o final dos anos 90 era o mais influente órgão de comunicação do interior do Rio Grande do Norte.

Vi o seu diretor-geral, Canindé Queiroz, se esconder atrás de uma porta e orientar sua secretária para evitar que um ex-prefeito aportasse em sua sala. Antes recebido com pompa, fora do governo teria perdido importância a seus olhos.

Constatei ali, que eu valia menos ainda do que o ex-prefeito. Acordei a tempo.

Esses dois casos me fizeram despertar para meu papel transitório como comunicador social. Sou apenas parte da engrenagem, não sou “o cara”.

Meu "tempo de vida” na imprensa iria depender dos meios utilizados para essa sobrevivência, do esforço empregado e da paixão que carregava pelo ofício.

De forma alguma possuo musculatura para derrubar governo ou eleger alguém. Tenho consciência que formo opinião em certos segmentos e estimulo o debate. Chego até a ser ouvido em escaninhos institucionais.

Entretanto meu alcance tem limites. Minha palavra, o que escrevo, pode influenciar e pesar em discussões e contribuir pro bem ou mal, mas de forma relativa.

Gero círculos concêntricos, como uma pedra atirada no Oceano Atlântico, nesse lado da América. Só formarei ondas até o outro lado, se outras ondas forem sendo produzidas em série, até "quebrarem" na África. Essa "rede", sim, tem peso.

Só, não sou nada. Apenas uma voz pífia e quase inaudível, sem eco, de importância resumida.

Durante anos setores da chamada Grande Imprensa tentaram solapar o Governo Lula, implodir sua gestão e apeá-lo da cadeira presidencial. Ele cumpriu dois mandatos e saiu ovacionado, conforme as pesquisas atestaram.

Cadê o Quarto Poder?

A contribuição que acredito estar ofertando ao meu tempo e, às gerações que estão por vir, é a do trabalho à formação de uma massa crítica, no fomento à dialética fundamental à montagem de outra ordem social e política.

É um pingo no oceano? É, Mas é uma missão a que me propus, mesmo que a pedrinha atirada na água faça apenas algumas marolas, incapazes de chegar em alto mar.

Digo-lhe, que já me sinto recompensado. Sei que tenho sido capaz de ser uma centelha, uma chave na vida de algumas pessoas. São vetores desse tempo que sonho e talvez não alcance.

O webleitor e diretor de criação de uma agência de publicidade de Mossoró, Klerilson Gomes, 24, pai de uma criança de 1 ano de idade, à semana passada redobrou minhas forças e a consciência dessa tarefa:

“(…) Sou um leigo quando o assunto é política, porém nos últimos tempos a partir de quando comecei a acessar seu Blog, aumentou bastante meu interesse no assunto (…). Um motivo especial para meu entusiasmo sobre as questões do poder, é o fato de ser pai, preocupado com o futuro, sobretudo da minha filha. Sendo assim queria parabenizá-lo pelo espaço. Sou solidário quanto à perseguição a você e espero que tenha sempre força para não desistir, e sim seguir em frente nessa batalha diária (…)”.

Que assim seja!

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Categoria(s): Nair Mesquita

Comentários

  1. MARCOS PINTO - Da AAPOL, ICOP, IHGRN e do IANTT. diz:

    Lídimo e ínclito AMIGO Carlos, existe uma frase corriqueira que afirma que toda caminhada começa com o primeiro passo. Com certeza, suas inteligentes e oportunas dissecações dos fatos, históricos ou não, que surgem na azáfama das imagens cotidianas, tem delineado um novo horizonte cognitivo e intelectivo, para muitos que se encontravam entregues à inércia e à letargia da omissão cumpliciosa,sem iniciativa para impulsionar o primeiro passo. Continue sendo o fermento conscientizador de alguns incautos, que insistem em não querer ser uma força propulsora, no imprescindível processo de mudanças que conduzam ao bem coletivo da sociedade.

  2. Honório de Medeiros diz:

    Que beleza!!!

    Parabéns, Carlos Santos. Eu gostaria de ter assinado essa crônica.

    Parabéns, também, a Klerilson Gomes: que a vida de seu filho seja leve.

    Honório de Medeiros

  3. Francisco Edvan de Queiroz diz:

    A verdade caro amigo é que vivemos na sociedade do ser e do ter. do ser poderoroso e do ter poder. A qualidade da pessoa humana é um detalhe não muito siginicativo neste sentido. Mas falando da pedra, acredito na força das pequenas pedras como você, como eu, e como tantos, que em momentos instantâneos e épicos da história, conseguem fazer a diferença. Você é um profissional que tem o dom da palavra, e será um grande jurista.

  4. Zenóbio Oliveira diz:

    Quando Theodor Adorno, mesmo admitindo as potencialidades dos meios de comunicação, não acreditava que estes seríam agentes da transformação social por serem o braço de uma indústria cultural convertida em sistema, na certa não imaginava, ou se imaginava não previa essa convergência da comunicação social para um suporte, digamos, muito mais democrático. Ainda que os poderosos tentem reprimi-la, a rede mundial de comunicação já é uma realidade, com perspectivas bem promissoras. E é neste espaço, neste campo de atividade onde estão os sujeitos da transformação de nossa sociedade, longe dos limites editoriais criados nas redações tradicionais e bem distantes dos gatekeepers dos chefes midiáticos. Neste contexto você, Carlos, é sim um promotor dessa transformação e um caminho a ser seguido.
    Parabéns pela competência, honra e ousadia com que desenvolve seu trabalho.
    Um exemplo.
    Zenóbio Oliveira.

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