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domingo - 19/11/2017 - 08:46h

A roda dos pavões

Por François Silvestre

Ou a vida na política. Impossível nas relações da vida a ausência da política. Posto que sua interferência na convivência humana independe da nossa vontade.

Assim ocorre na fisiologia orgânica, cujas necessidades estimuladas, manifestadas na vontade, fogem do nosso controle; tanto na intensidade quanto no momento escolhido pelo organismo. Inclusive o impulso sexual, que não é escolha ou opção.

É bem verdade que aqui não se fala de política estritamente eleitoral, partidária ou participativa. Essa sim, pode ser descartada pela vontade ou enfado. Porém, a política, no sentido amplo do conviver familiar ou social, está presente de forma tão indispensável que nem notamos. Da mesma forma que não percebemos o ar ao respirarmos. Só sentimos sua falta no afogamento ou na asma.

Politizar-se é uma forma de aprimoramento da dignidade. Seja pela participação ostensiva ou pelo simples observar conscientemente. E essa observação consciente se dá pela crítica.

A crítica é o mecanismo instrutivo que liberta. Da lição de Karl Marx: “A crítica não pretende enfeitar as grades, com flores, para atenuar o cárcere. Mas quebrá-las, para a colheita da flor viva”. Inclusive para quebrar amarras ideológicas. Marx não era marxista. Da mesma forma que Cristo não era cristão.

O que tem produzido certo enfado, ou até mesmo asco, com a prática política é a deformação do seu exercício, piorada a cada pleito. De tal forma que leva suas consequências ao embate primitivo das campanhas. Nesse teatro onde viramos ancestrais dos símios. De moderno, só o jogo das moedas.

Torcidas organizadas de times de pernas-de-pau. O que garante à demagogia a dominação do mando. E asseguram aos inquilinos dos palácios um atestado de quase usucapião.

Mesmo estando presente em tudo a política não é ciência. Colega do Direito, no campo da arte/técnica. Para que um conjunto cognitivo se configure ciência é imprescindível a presença de Leis. O que há na matemática, física, química, biologia.

No Direito e na Política não há Leis. Há normas. A Política produz normas e o Direito as aplica. É uma impropriedade semântica a expressão “cientista político”. É comentarista de política. A sociologia não é ciência; não há Leis nas relações sociais e humanas. Só normas, jurídicas ou consuetudinárias.

Há uma linha tênue e invisível que une a política à literatura. Toda ela no campo da ficção. Poucos romancistas conseguem inventar roteiros tortuosos e falsos quanto os políticos. Se bem que estes estão mais para mentirosos do que ficcionistas.

É raro o país que consegue o milagre brasileiro de sobreviver à instabilidade institucional. Onde a vaidade dos membros das instituições as reduz ao tamanho do ridículo individual.

Quanto maior o ego dos componentes, menor a eficiência da instituição. Para essa gente, a exigência de impessoalidade, na Carta Magna, só serve para o povão. Não se aplica aos pavões.

Té mais.

François Silvestre é escritor

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. naide maria rosado de souza diz:

    François Silvestre, grande.
    Desde cedo notei uma abissal diferença entre o ar político respirado em Mossoró e outras cidades do nordeste e o respirado aqui, no RJ, no meio em que vivo, não exatamente na “pele em que habito”.
    No nordeste , a política revestia-se nas cores dos candidatos, em suas músicas, jingles bem bolados, refletidos no ardor e fervor dos eleitores.
    Comícios, grandiosas festas, nos quais o povo desopilava uma esperança genuína, misturada com a vontade de dançar…festa popular. Dia de comício, dia feliz!
    Independentemente de ver frustradas suas esperanças em promessas não cumpridas, anos depois, aquele mesmo povo estaria cantando e dançando por aqueles candidatos, ou outros piores, garantindo-lhes o “usucapião “.
    Cheguei a pensar que o nordestino, particularmente o potiguar, como eu,tinha a política nas veias. Depois, algo mais sombrio veio me dizer que a ida aos comícios se integrara numa espécie de cultura popular, ou numa fuga à realidade da pobreza, ao se sentirem festejados por aqueles dos palanques, tão simpáticos e risonhos como seus vizinhos de porta.
    Manifestar sua preferência política e defendê-la era, e talvez ainda seja, não propriamente um ideologia, mas uma questão de fé, quase religião.
    Aqui o ar político só aparece em hecatombes, como a de nossa vergonhosa AL, há dois dias.
    Cada pessoa tem seu candidato, raras vezes participado. Nem curiosidade existe. Esse tipo de política, foi descartado “pela falta de vontade ou enfado.”
    A outra política, a indispensável, a da convivência familiar e social deve existir sim, no abrigo das casas.
    Que não nos falte o poder de criticar, caso contrário, não faríamos falta. Mesmo a crítica silenciosa…aparece no nosso procedimento.

  2. João Claudio diz:

    Os burros nordestinos são exibidos enquanto que os burros da Big Favelona são enrustidos. Só saem do armário para curtir samba e pagode.

    ‘Uz cariocaz são ixpertu’. Elegem Cabral, Eduardo Paes, Pezão e a família Picciani, sem contar com as outras centenas de pilantras que roubam e não da descobertos.

  3. João Claudio diz:

    Não confundir a roda do pavões com a ‘rosca’ dos pavões.

    • naide maria rosado de souza diz:

      João Cláudio. Você não compreendeu bem. Cariocas não ficam dentro do armário. Convivem bem com pessoas que não votam em seus candidatos. Isso não provoca desarmonia.
      Estão conscientes dos erros que cometeram elegendo as pessoas citadas.
      Samba e pagode, meu senhor, se pudesse aconteceriam todos os dias, independentemente de patrocínio.
      Há um samba no pé irresistível, este sim, embutido em quem nasce aqui, contagiando os que não nascem, como eu.
      Penso que há consenso familiar, no votar, respeitadas exceções.
      Participei ativamente da campanha de um deputado federal. Não com o apoio de meus amigos, o que em nada diminuiu a nossa amizade. Havia necessidade de um contato com prestígio para ajudar os meus amigos das ruas. O fruteiro já havia recebido o alerta da fiscalização para sair do ponto em que trabalhava. Uma falta de luz habitual colocava em risco a atividade do açougueiro. Eles e outros resolveram se reunir e me escolheram para reivindicar. De início, fiquei meio encabulada, mas cumpri o que me foi pedido. O candidato veio aqui e participou de uma reunião. Resultado: saiu o alvará do fruteiro, em poucos dias um enorme carro da Light apareceu e resolveu aquele problema quase centenário da falta de luz.
      São meus amigos, o açougueiro, o fruteiro e outros tantos.
      Quando quebrei o tornozelo e desapareci do mapa, eles ficaram preocupadissimos e vieram saber o que acontecera comigo.
      Não pense, João Claudio que a carne do açougue é gratuita para a nossa família. Pagamos e pagamos bem.
      Não pense, João Claudio que nossas frutas são de graça. Pagamos e pagamos bem. No entanto, há algum tempo, uma de minhas filhas foi correr, exagerou e teve uma tontura. O fruteiro colocou-a sentada naquele banquinho de madeira, descascou uma banana e deu para ela que ficou logo bem com a ingestão do potássio.
      Entendeu que a retribuição é paga com carinho?
      Entendeu que não se digladiar necessariamente não quer dizer estar dentro do armário?
      Pois é, pergunte o que acontece comigo quando ouço um batuque? Saio sambando. .. porque prevalece em mim o sangue potiguar, mas o meu interior não despreza a cidade que me acolheu.

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