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domingo - 31/07/2011 - 00:14h
Conversando com... Stella Galvão

Interatividade em blogs refaz alguns conceitos jornalísticos

Stella Galvão é jornalista graduada pela UFRN, com especialização na Escola de Comunicação e Artes da ECA-USP, em Gestão de Processos Comunicacionais e em Bioética pela FMUSP, além de mestrado em História da Ciência pela PUC-SP. Atuou como repórter nos jornais Folha de São Paulo, Jornal da Tarde e o Estado de S. Paulo (ao longe de uma década e meia). Na capital paulista, também fez trabalhos no segmento da comunicação corporativa, depois de criar sua própria empresa, a GCOM Comunicação. Ainda em São Paulo, ela coordenou a 1ª Oficina de Jornalismo na Internet, em 1997, iniciativa da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Atualmente, é professora e pesquisadora nos cursos de Comunicação da Universidade Potiguar (UnP), associada à Associação Latino Americana de Investigadores da Comunicação (ALAIC) e da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, além de exercer o jornalismo em trabalhos pontuais para editoras paulistanas.

Stella redimensiona importância do "furo" jornalístico

Blog do Carlos Santos – Professora, como integrante da Associação Latino-Americana de Pesquisadores da Comunicação (ALAIC), a senhora realizou denso trabalho sob o título “Blogs jornalísticos e simultaneamente políticos: Uma imbricação de campos”. Sua área de pesquisa foi o próprio Rio Grande do Norte.  Que observações e constatações mais interessantes são extraídas desse estudo?

Stella Galvão – Os blogs passaram a compor um meio híbrido com a expansão vertiginosa da Internet, sobretudo a partir da segunda metade da década de 90. O que testemunhamos? Blogs jornalísticos têm funcionado não apenas como versões eletrônicas de colunas impressas, mas também têm sido explorados em outras modalidades, seja como alternativa para profissionais que desejam oferecer coberturas independentes e não atreladas a grandes meios, seja como canal de experimentação de novos formatos e linguagens ou ainda como meios mais ágeis e com conteúdos privilegiados/exclusivos. A interação direta entre público e mídia causa uma reviravolta nos conceitos até então adotados pelas teorias da recepção. Quebrou-se o monopólio da opinião e o próprio webleitor participa diretamente da construção de uma bolha crítica.

BCS – O advento das mídias digitais e das redes sociais como Facebook, Orkut, Twitter etc. tem gerado uma efervescente discussão sobre o futuro dos veículos de comunicação convencionais e a profissão de jornalista. Essa nova forma de se comunicar significa o fim iminente do jornal impresso, o esvaziamento do rádio e a perda de força da TV?

Stella Galvão – Desde que a internet se afirmou no mundo inteiro, na segunda metade da década de 1990, os cenários traçados para os meios de comunicação estão sempre impregnados de visões apocalípticas. Desde então, pesquisas têm apontado que parte expressiva do que é discutido na social media se origina nos meios impressos, rádio ou TV. Então não faz sentido apontar o fim de uma atividade por causa das ferramentas digitais se estas continuam recorrendo à mídia tradicional. Aliás, blogs de prestígio muitas vezes são uma extensão do jornalismo praticado nos meios impressos. Hoje, já se discute que as mídias sociais realmente extinguirão os tradicionais modelos de negócio, forçando a imprensa a procurar melhores maneiras que se adaptem ao novo modo de consumo de informações e às dinâmicas dos meios digitais, promovendo maior interação junto aos seus leitores. O jornalismo continuará fazendo o seu papel, mesmo não sendo, em um futuro próximo, de papel.

BCS – As redes sociais ainda engatinham, mesmo assim são uma febre mundial. Elas, de alguma forma, quebram o monopólio da notícia, que em tese é do jornalista profissional ou não possuem qualquer relação direta ou indireta com o jornalismo?

Stella Galvão – O que assistimos hoje é uma mudança de perspectiva na geração de notícias. Na comunicação há uma área de estudos chamada de ‘Teoria da Recepção’. No ciberespaço, todo mundo é autor, ninguém é autor, todos somos produtores-consumidores. Pierre Lévy, verdadeiro ‘papa’ teórico da cibercultura, descreve essa reconfiguração: “Nós vivemos um desses raros momentos, onde, partindo de uma nova configuração técnica (…), inventa-se um estilo de humanidade”.

BCS – Qual o papel do furo jornalístico, num mundo que virou uma grande aldeia online, ligada por vasos comunicantes virtuais? Faz sentido “brigar” pelo furo, para em poucos segundos esse “feito” se dissipar? O furo não é mais o “top” da hierarquia da notícia com o advento do webjornalismo?

Stella Galvão – O furo, tradicional objeto de desejo do jornalista e obsessão da prática jornalística para noticiar algo em primeira mão, virou o inverso porque agora é uma entidade pública. São cada vez mais frequentes as notícias postadas por pessoas comuns que as vivenciam de muito perto e podem postar na internet instantaneamente por meio de um dispositivo móvel como iphones. Notícias factuais têm muito menos chance de virem à tona de forma inédita nas mídias tradicionais. O que o jornal publica em um dia frequentemente já era conhecido na véspera, no momento da ocorrência, como resultado de postagens no twitter ou no facebook por parte de usuários e pelos próprios jornalistas.

BCS – Como docente da Universidade Potiguar (UnP), a senhora prioriza a instalação de Pós-Graduação em Mídias Sociais e Comunicação Digital nessa academia. Essa é uma iniciativa compulsória, em face de um mercado que cobra o conhecimento cientificista à formação de novos profissionais?

Stella Galvão – A decisão de planejar e propor o curso, que contou com o apoio imediato da direção da UnP, é um desdobramento e uma decorrência natural da minha imersão no tema como pesquisadora e como palestrante. As redes sociais mudaram a maneira das pessoas se comunicarem e já revolucionaram até mesmo a forma de comunicação entre empresa e consumidor. Vivemos em uma sociedade transparente que expõe pessoas físicas e jurídicas de um modo antes impensável. As novas mídias e a cibercultura têm configurado  a comunicação contemporânea como um terreno em contínua mutação e interatividade. Assim, a produção incessante de conteúdos e as interações comunicacionais constituem mudanças radicais e irreversíveis no modo de vislumbrar e compreender o mundo.Segundo o Ibope/Nielsen, cerca de 75 milhões de brasileiros tiveram acesso à internet no último semestre. Então, a Pós que coordeno pretende formar profissionais para atuarem no mercado da comunicação com ferramentas hoje indispensáveis.

BCS – A enxurrada de informação no mundo digital, paradoxalmente parece ter criado o ambiente perfeito à pasteurização da notícia, a síndrome do “Control C/Control V”. Como transformar a facilidade no insumo básico de um jornalismo com mais conteúdo e menos acrítico?

Stella Galvão – O que você coloca encontra eco na realidade todos os dias em blogs, sites, portais etc., mas também nas mídias tradicionais. Infelizmente a apropriação do texto alheio sempre existiu, mas realmente foi intensificada com a circulação de informações. Prova disso é que as ‘barrigas’ (informação jornalística inverídica) não são raras, e acontecem em jornais, revistas, rádios e TVs, além da internet, claro. O meio eletrônico facilitou e muito a prática de fugir da apuração e basear a notícia veiculada na versão de outro, que supostamente a apurou bem. Gay Talese, um dos fundadores do New Journalism, corrente surgida nos EUA na década de 1970 que fez escola em todo o mundo, propondo um texto elegante e bem elaborado. Para ele, não são os jornais, mas sim o jornalismo que está sendo ameaçado pela internet. E o principal motivo é que a internet faz o trabalho de um jornalista parecer fácil. Tipo colar e copiar. E não se trata disso. Plágio é crime e punível por lei.

Web lança novo olhar sobre a comunicação

BCS – Mesmo com experiência vitoriosa em redações, com passagem pelos emblemáticos O Estadão de S. Paulo e Folha de S. Paulo, a senhora optou pelas vias do ensino e da pesquisa para novo caminho profissional. Por quê? As redações perderam o charme e deixaram de ser desafiadoras?

Stella Galvão – A decisão de me estabelecer em Natal, e na área acadêmica, foi pensada com a finalidade de eu e minha família ganharmos uma vida mais prazerosa e tranquila. Praticamente toda a minha trajetória profissional, e a formação em pós graduação deu-se na capital paulista, mas um imperativo que fala mais forte. Em algum momento, as nossas raízes fazem um chamamento para aqueles que migram. Especialmente quando essas raízes estão incrustradas num lugar que tem a beleza do pôr do sol em Natal. Tive a sorte e o privilégio de abraçar a carreira acadêmica mas, em paralelo, continuo colaborando com publicações de editoras paulistas como a Segmento Farma, para cujas revistas eu escrevo regularmente.

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Comentários

  1. Nara Borges diz:

    Belas entrevista, grande profissional e ótima professora.

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