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domingo - 24/09/2017 - 08:10h

O Exército politizado

Por François Silvestre

O ocaso do Estado Novo, a inclusão do Brasil no rol dos combatentes aliados, a expectativa de liberdades democráticas, num processo irreversível de redemocratização criaram no intestino das Forças Armadas um clima de confronto ideológico.

Tudo isso acentuado após o fim da Segunda Guerra. O Exército brasileiro, agente ativo de todas as mobilizações políticas desde a proclamação da República, torna-se, no fim dos anos Quarenta, e nas décadas seguintes, um conglomerado político e politizado. E como é da essência política, dividido.

A divisão da caserna, nesse quadro, guardava contornos típicos de uma agremiação partidária heterogênea. Duas alas, antes restrita ao Clube Militar, assumiam suas posições conflitantes, com influência na vida político-partidária do país.

Uma ala à direita, sob a liderança do general Canrobert Pereira da Costa, e outra à esquerda, liderada pelo general Estillac Leal.

Em três de Outubro de 1955, ocorrem as eleições para presidente e vice-presidente da República. O voto não era vinculado, cada cargo tinha disputa independente. Disputaram a presidência Juscelino Kubistchek, Juarez Távora, Adhemar de Barros e Plínio Salgado. Para vice-presidente eram candidatos João Goulart, Milton Campos e Danton Coelho.

Juscelino e Jango foram os vencedores. A UDN, sob a liderança de Lacerda e Afonso Arinos, induziram o presidente Café Filho a não dar posse aos eleitos. Sob a alegação de que JK não obtivera mais de cinquenta por cento dos votos. A lei de então não continha essa exigência, e a Justiça eleitoral não considerou procedente o esperneio da UDN.

No último dia de Outubro, morre o general Canrobert Pereira da Costa, líder da ala direita do Exército. Estillac Leal morrera antes das eleições. No sepultamento de Canrobert, na presença do Ministro da Guerra, general Lott, o coronel Bizarria Mamede (general em 64) faz um discurso político, exigindo novas eleições e negando a posse dos eleitos.

Nas memórias de Lott ele conta que não prendeu Mamede, naquele momento, por respeito à família do morto. Mas cobrou do presidente Café a punição do coronel.

Sob pressão Café “adoeceu”, internou-se e passou a presidência a Carlos Luz, presidente da Câmara dos Deputados. Lott pediu audiência ao interino para cumprir a punição de Mamede. Após duas horas de espera, na antessala da presidência, Carlos Luz recebeu Lott e desautorizou a punição. “Não há nada nem ninguém para ser punido”.

Lott pediu demissão. Carlos Luz aceitou e cometeu o erro de adiar a posse do novo ministro.

Já em casa, o general Lott comunica-se, por um rádio de campanha, com o colega Odílio Denys. Conta o ocorrido. O general Denys pergunta quem era o novo ministro. Lott responde que não sabia e que a posse do mesmo ficara para o dia seguinte. Odílio Denys orienta: “Então você ainda é o Ministro. Sua saída será o desrespeito ao resultado das eleições. Os eleitos não tomarão posse”.

Lott pôs os tanques na rua, depôs Carlos Luz e colocou na presidência o presidente do Senado, Nereu Ramos. Mamede foi punido.

A UDN articulou a volta de Café à presidência, pois o mesmo declarara-se “curado”. Teixeira Lott cercou o apartamento de Café Filho, em Copacabana, e declarou que ele continuava “doente”.

Em primeiro de Janeiro de 1956, Juscelino e Jango tomaram posse. No início do governo JK sofreu duas tentativas de golpes, Jacareacanga e Aragarças. Mas isso é outra história. Té mais.

François Silvestre é escritor

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO diz:

    OBRIGADO CARO FRANÇOIS SILVESTRE, por mais uma pequena, ilustrativa e grandiosa aula com que nos brinda sobre a nossa controvertida história política e militar recente.

    Um baraço

    FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO.
    OAB/RN. 7318.

  2. François silvestre diz:

    Naquele episódio, Castelo Branco ficou ao lado da UDN, defendendo novas eleições. Costa e Silva ficou com Lott. Tempos depois, no governo Jânio, Costa e Silva foi caroneado, numa promoção por mérito, tendo alcançado a mesma por antiguidade. Após o golpe de 64, Costa e Silva vingou-se de Jânio, que foi cassado contra a vontade de Castelo. Sendo o mais antigo da ativa, Costa e Silva assumiu o comando militar do golpe e quase não deixa Castelo ser presidente. O mesmo fez castelo, que não queria Costa e Silva na sua sucessão. Isso tudo está contado em dois depoimentos. O de Lacerda e o de Geisel. Geisel inclusive diz: “Costa e Silva emparedou Castelo. O mesmo que Silvio Frota quis fazer comigo”.

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