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sexta-feira - 14/07/2017 - 10:15h
Política e Cultura

O “Monólogo das mãos” e a “Crônica do dedo”

Giuseppe Ghiaroni – (1919-2008) – poeta, jornalista e cronista, mineiro de Parnaíba do Sul, morreu em 2008, aos 89 anos, com importante atuação em trabalhos para o rádio, teatro e imprensa escrita.

Mas em especial, deixou um texto imortal e imortalizado no tablado pelo grande ator teatral Procópio Ferreira: o “Monólogo das mãos!”

Raimundo expõe seu dedo médio direito (Foto: web)

O texto faz parte da peça “O vendedor de ilusões” de Oduvaldo Viana, escrito para Procópio Ferreira.

Com uma indagação de preâmbulo, ele descortina e enumera o bem e o mal que elas, as mãos, representam à vida e à história do homem.

Agora, no Rio Grande do Norte, temos uma versão grotesca e reducionista, do papel do “dedo”. Sim, o dedo médio.

Coube ao deputado estadual de longo curso, Raimundo Fernandes (PSDB), expor seu dedo médio direito em riste na direção de manifestantes que ocuparam o plenário da Assembleia Legislativa dia passado (quinta-feira, 13). Esgrimou com ele, em reação a palavras de ordem que censuravam a bancada governista pela aprovação de matéria (veja AQUI) que congela salários em 2018.

Não ficou bem para o deputado e para a Casa do Povo essa “Crônica do Dedo”. Optamos pela obra genial de Ghiaroni, que a reproduzimos abaixo:

Monólogo das mãos

Para que servem as mãos?

As mãos servem para pedir, prometer, chamar, conceder, ameaçar, suplicar, exigir, acariciar, recusar, interrogar, admirar, confessar, calcular, comandar, injuriar, incitar, teimar, encorajar, acusar, condenar, absolver, perdoar, desprezar, desafiar, aplaudir, reger, benzer, humilhar, reconciliar, exaltar, construir, trabalhar, escrever…

As mãos de Maria Antonieta, ao receber o beijo de Mirabeau, salvou o trono da França e apagou a auréola do famoso revolucionário;

Múcio Cévola queimou a mão que, por engano não matou Porcena;

Foi com as mãos que Jesus amparou Madalena;

Com as mãos David agitou a funda que matou Golias;

As mãos dos Césares romanos decidia a sorte dos gladiadores vencidos na arena;

Pilatos lavou as mãos para limpar a consciência;

Os anti-semitas marcavam a porta dos judeus com as mãos vermelhas como signo de morte!

Foi com as mãos que Judas pôs ao pescoço o laço que os outros Judas não encontram.

A mão serve para o herói empunhar a espada e o carrasco, a corda;

O operário construir e o burguês destruir;

O bom amparar e o justo punir;

O amante acariciar e o ladrão roubar;

O honesto trabalhar e o viciado jogar.

Com as mãos atira-se um beijo ou uma pedra, uma flor ou uma granada, uma esmola ou uma bomba!

Com as mãos o agricultor semeia e o anarquista incendeia!

As mãos fazem os salva-vidas e os canhões;

Os remédios e os venenos;

Os bálsamos e os instrumentos de tortura, a arma que fere e o bisturi que salva.

Com as mãos tapamos os olhos para não ver, e com elas protegemos a vista para ver melhor.

Os olhos dos cegos são as mãos. As mãos na agulheta do submarino levam o homem para o fundo como os peixes;

No volante da aeronave atiram-nos para as alturas como os pássaros.

O autor do Homo Rebus lembra que a mão foi o primeiro prato para o alimento e o primeiro copo para a bebida;

A primeira almofada para repousar a cabeça, a primeira arma e a primeira linguagem.

Esfregando dois ramos, conseguiram-se as chamas.

A mão aberta, acariciando, mostra a bondade;

Fechada e levantada mostra a força e o poder;

Empunha a espada a pena e a cruz! Modela os mármores e os bronzes;

Dá cor às telas e concretiza os sonhos do pensamento e da fantasia nas formas eternas da beleza.

Humilde e poderosa no trabalho, cria a riqueza;

Doce e piedosa nos afetos medica as chagas, conforta os aflitos e protege os fracos.

O aperto de duas mãos pode ser a mais sincera confissão de amor, o melhor pacto de amizade ou um juramento de felicidade.

O noivo para casar-se pede a mão de sua amada;

Procópio: com as mãos (Foto: Web)

Jesus abençoava com as mãos;

As mães protegem os filhos cobrindo-lhes com as mãos as cabeças inocentes.

Nas despedidas, a gente parte, mas a mão fica, ainda por muito tempo agitando o lenço no ar.

Com as mãos limpamos as nossas lágrimas e as lágrimas alheias.

E nos dois extremos da vida, quando abrimos os olhos para o mundo e quando os fechamos para sempre ainda as mãos prevalecem.

Quando nascemos, para nos levar a carícia do primeiro beijo, são as mãos maternas que nos seguram o corpo pequenino.

E no fim da vida, quando os olhos fecham e o coração para, o corpo gela e os sentidos desaparecem, são as mãos, ainda brancas de cera que continuam na morte as funções da vida.

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Categoria(s): Cultura / Política

Comentários

  1. Vicente diz:

    Isso sim é feio. É embaraçoso.

  2. Everton Maia diz:

    Texto genial. Daqueles que merece leitura compartilhada. Boa indicação, Carlos!

  3. João Claudio diz:

    É com as mãos que acontece o ”toma lá da cá” entre politico e comissionados.

    É com as mãos que se da e se recebe propinas.

    É com as mãos que os políticos espertos dão aquela tapinha nas costas dos eleitores trouxas.

    É com as mãos que os presidentes assinam medidas provisórias para facilitar a vida de empresários (♫ Muuuuuu)

    É com as mãos que se pega o papel higiênico para limpar a ( * ).

    É com as mãos que se da cocorote em menino traquino.

    É com as mãos que se joga pedra no telhado do vizinho.

    É com as mãos que se cata piolho.

    É com as mãos que se ”da o dedo”.

    É com as mãos que se escreve a palavra ”mãos”.

    São as mãos que assinam cheque sem fundos.

    Se eu fosse falar mais sobre as mãos, as minhas ficariam calejadas.

    ☛ Bye

  4. naide maria rosado de souza diz:

    Que beleza! Muito bom ter chance de, com as mãos, poder agradecer por ler esse texto.

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